Phytophthora infestans – Conhecendo o inimigo

Eduardo S. G. Mizubuti – Professor Adjunto Depto. de Fitopatologia, Universidade Federal de Viçosa, 36570-000 – Viçosa/MG (31) 3899-1090; (31) 3899-2240 – mizubuti@ufv.br


Apesar de a requeima ou mela ser uma das doenças mais destrutivas da batateira e ser velha conhecida dos produtores, pouco se conhece sobre aspectos da biologia de isolados brasileiros do agente causal, Phytophthora infestans. Várias características relativas aos diferentes estádios de desenvolvimento de P. infestans foram intensivamente pesquisadas em laboratórios de países europeus e dos Estados Unidos. As informações geradas contribuiram para o melhor entendimento de como o patógeno é capaz de causar a doença, como fatores de ambiente (temperatura, umidade, radiação solar etc.) interferem no patógeno e as características genéticas de populações de P. infestans. Porém, mesmo sendo a requeima doença conhecida e relatada como problemática desde fins do século XIX, no Brasil, poucas pesquisas foram conduzidas com o objetivo de entender como P. infestans se desenvolve e como é afetado por nossas condições climáticas. Para começar, P. infestans não é fungo. Os especialistas concluíram que o organismo é mais semelhante a algas que a fungos! Por essa razão, o correto é classificar P. infestans como oomiceto. No entanto, a semelhança do ciclo de vida e da funcionalidade das estruturas formadas por P. infestans com as de fungos, é muito grande. Para fins práticos, pode-se considerar P. infestans como oomiceto tipofungo.


À semelhança do que ocorre com os fungos, P. infestans pode reproduzir de duas maneiras: sexuada e assexuada. Para que P. infestans possa reproduzir sexuadamente é necessário haver indivíduos de “sexo” oposto, como nos animais onde tem-se machos e fêmeas. Quando a reprodução sexuada ocorre, há formação de uma estrutura denominada oósporo. O oósporo é um esporo bem protegido que pode sobreviver por períodos prolongados no solo, mesmo na ausência de plantas de batata. Além disso, em locais onde oósporos são formados, a população de P. infestans é muito mais diversificada.


Tal diversidade dificulta o controle da requeima por aumentar as chances de haver indivíduos insensíveis a fungicidas, de indivíduos capazes de suplantar a resistência de variedades, de surgirem indivíduos mais adaptados às condições climáticas locais etc. Para a reprodução assexuada, um indivíduo pode reproduzir sem a participação de outro. Neste caso, os descendentes são “cópias” exatas do indivíduo do qual originaram, estas “cópias” são denominadas clones. Um único indivíduo pode gerar dezenas, centenas ou milhares de outros novos indivíduos.


Para exemplificar este mecanismo, basta pensar no que ocorre com a com a batateira. Uma planta da variedade “X” pode produzir vários tubérculos, todos também da variedade “X”, portanto “cópias” da planta-mãe. Por sua vez, os tubérculos originarão várias outras plantas. A forma de reprodução é determinada por características das populações do patógeno, daí o ponto de partida para entendimento da biologia de P. infestans é conhecer as populações que ocorrem no Brasil.


No Brasil, há duas populações de P. infestans estabelecidas, uma denominada US-1 e outra denominada BR-1. Curiosamente, estas populações são específicas para determinada cultura. A população US-1 causa requeima em tomateiro e a BR-1 em batateira. Atualmente, P. infestans não reproduz de maneira sexuada no Brasil. Assim, até o momento, não há evidências de formação de oósporos. Mas, esta situação pode mudar a qualquer momento, o que tornaria o manejo da requeima mais dificultado, pelas razões expostas acima. Outra informação importante é que as populações brasileiras de P. infestans diferem das de outros países, não somente geneticamente como também respondem de forma diferenciada aos fatores climáticos. Tal fato é esperado, uma vez que as condições climáticas brasileiras são bem diferentes das de países de clima temperado; principalmente a ausência de invernos rigorosos. Em países de clima temperado com invernos rigorosos, as baixas temperaturas afetam a sobrevivência de P. infestans e impossibilitam o culti o de plantas hospedeiras (principalmente batateira e tomateiro). Por essa razão, a quantidade de “esporos” de P. infestans disponíveis para iniciar as epidemias de requeima é baixa.


 
Campo experimental destruído pela requeima (Foto: Eduardo S. G. Mizubuti)



Lesão causada por Phytophthora infestans, com esporulação de cor clara, em folíolo de batateira. Foto: Eduardo S. G. Mizubuti


 


Nossas condições climáticas permitem maior sobrevivência de P. infestans e também mais de um cultivo de batateira ou de tomateiro durante o ano. Esporos de P. infestans podem ser encontrados no ar em todas as épocas do ano. Portanto, havendo condições climáticas favoráveis, é possível haver epidemias em qualquer época e a doença pode ocorrer em qualquer estádio de desenvolvimento da cultura. Obviamente, as condições climáticas de uma época podem ser mais ou menos favoráveis à doença, mas é importante saber que P. infestans está presente o ano todo.


O patógeno pode sobreviver em restos de culturas que ficam na área e neles produzir esporos que iniciam epidemias de requeima. No entanto, as informações disponíveis até o momento apontam que a sobrevivência nos restos de cultura é inferior a 60 dias. Por essa razão, acredita-se que a principal maneira pela qual P. infestans sobrevive na ausência de cultivos de batata seria em tomateiros ou em plantas não cultivadas. Vários estudos estão sendo conduzidos com o objetivo de determinar se há outras plantas, além de batateira e tomateiro, que podem ser infectadas por P. infestans.



A principal forma de controle da doença ainda é a aplicação de fungicidas. Existem vários produtos eficientes no mercado. É necessário salientar que o uso adequado destes produtos, principalmente dos fungicidas sistêmicos, é imprescindível para manutenção da eficiência do controle. O patógeno P. infestans é considerado de alto risco para seleção de indivíduos insensíveis a fungicidas. Na Europa, populações resistentes a metalaxyl são conhecidas desde a há muito tempo, e em locais onde ocorrem, o controle da doença com o produto é deficiente.


Recentemente, concluiu-se um estudo que avaliou a sensibilidade de isolados de Estados das regiões Sul e Sudeste do Brasil aos principais fungicidas protetores ou de contato usados no controle da requeima. Os resultados permitiram concluir não haver evidência de resistência a estes produtos. O uso de sistemas de previsão como auxiliar na tomada de decisão pode resultar em controle mais eficiente da doença. Testes de campo, nas condições da Zona da Mata de Minas Gerais, indicaram que a eficiência dos sistemas BLITECAST, Wallin e SIMCAST variam conforme a época do ano. Antes de serem utilizados, é importante avaliar o desempenho destes sistemas nos locais onde serão implementados, nas diferentes as estações de cultivos.


Outras formas de controle da doença também estão sendo pesquisadas. Maiores avanços têm sido conseguidos para a obtenção de variedades resistentes. Recentemente, verificou-se que o gene RB7 originado de Solanum bulbocastanum confere resistência duradoura à requeima e é eficiente para diferentes raças do patógeno. Esta característica é importante principalmente quando o material resistente for plantado em regiões onde há muitas raças de P. infestans, como o verificado nas regiões Sul e Sudeste do Brasil. Métodos alternativos de controle como o uso de caldas, extratos de plantas e controle biológico, também estão sendo investigados.


Estes métodos são importantes principalmente para atender produtores de batata orgânica. Infelizmente, até o momento, poucos trabalhos foram publicados em revistas científicas com demonstração convincente da eficiência destes métodos. Na UFV, iniciaram-se trabalhos visando a busca de alternativas para o controle da requeima em cultivos orgânicos.


Espera-se que, em breve, seja possível obter resultados que auxiliem o estabelecimento de diretrizes para o manejo da doença neste tipo de cultivo.


O avanço das pesquisas tornará possível o controle mais eficiente da requeima, com uso mais racional de fungicidas, menor impacto ambiental e maior rentabilidade ao bataticultor. A integração do setor produtivo com o da pesquisa é fundamental para o sucesso dessa iniciativa.

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